04/02/1999 (87 anos)
Goianésia, GO, Brasil
Goianésia, GO, Brasil
Pe. José Ambrósio Mota
Nascimento: 11 de março de 1912
Localidade: Patrocínio do Sapucaí, SP
Pais: Sr. José e Sra. Maria
Profissão Religiosa: 06 de janeiro de 1931
Ordenação: 08 de dezembro de 1938
Falecimento: 04 de fevereiro de 1999
Servo Bom e Fiel
Na pequenina cidade de Patrocínio do Sapucaí, SP, nasceu no dia 11 de março de 1912 um robusto menino que, na pia batismal, recebeu o nome de José Ambrósio Mota.
De origem humilde, teve por progenitores o Sr. José Mota e Sra. Maria. Ainda criança, entrou para o seminário do Coração de Maria de São Paulo, onde cursou o ensino fundamental e médio. Em seguida, ingressou no noviciado de Guarulhos e emitiu sua Primeira Profissão Religiosa no dia 6 de janeiro de 1931.
Fez seus estudos eclesiásticos no Studium Theologicum de Curitiba, PR, tendo recebido a Unção Sacerdotal no dia 08 de dezembro de 1938, das mãos de Dom Ático Eusébio da Rocha, DD. Arcebispo Metropolitano, na nossa Igreja do Imaculado Coração de Maria.
Alma boa e simples. Aliás, a simplicidade, que é uma virtude tão rara quanto antiga, até foi lembrada pelo poeta Ovídio: “Aevo raríssima nostro simplicitas”, o neo-sacerdote que a possuía em altíssimo grau juntamente com todas as demais, mereceu dos superiores toda a confiança, por isso, o destinaram às dificílimas missões de Goiás, GO, onde viveu praticamente toda a sua vida. Vez por outra, também trabalhou nos Estados de São Paulo, SP, Salvador, BA e Minas Gerais, MG. Contudo, o reduto de suas façanhas missionárias foi sempre Goiás, GO.
De fato, em 1950 o encontramos na longínqua comunidade de Niquelândia, GO, desempenhando o cargo de Conselheiro II e Ministro.
As distantes e desprovidas comunidades de antanho: Posse GO e São Domingos, GO, guardam até hoje perenes recordações dos trabalhos missionários dos Padres Luiz Maria Olabarrieta e de José Ambrósio Mota.
Com a criação da diocese de Uruaçu, Pe. José Ambrósio passou a trabalhar em outras comunidades da diocese, notadamente Goianésia, GO, e Itapevi, GO. Em 1917 foi transferido para a comunidade de Patos de Minas, MG, como Conselheiro II e Ministro. Ali aconteceu-lhe um fato desagradável: o atropelamento seguido de morte de um senhor de idade. Embora reconhecido inocente pela Justiça, Pe. José Ambrósio ficou traumatizado e sentiu essa dor por toda a sua vida.
Com o encerramento da casa de Patos de Minas, MG, Pe. José Ambrósio voltou para a comunidade, não se sabe porque carga d’água passou a residir sozinho na casa Paroquial de Hidrolina, Go, cidadezinha incrustada no sertão goiano, desprovida de pároco, e relativamente perto de Itapaci, GO. Missionário apostólico, homem de fé, espírito arguto, de linguajar simples, de atitudes meio acabocladas, tudo isso o tornou queridíssimo do povo e, como ele se sentia bem no seu meio! Outra característica notória foi a sua disponibilidade e gosto em ajudar os irmãos de comunidades nas festas de Muquém ou nas capelanias de Guarinos, Pilar, São Luiz, Santa Terezinha, freguesias desprovidas de vigário e que estavam confiadas aos Padres Claretianos, especialmente os de Itapaci, GO.
A eloquência dos fatos nos revela mais vivamente a personalidade desse homem de Deus. Por seu turno, o testemunho do povo simples engradece sobremaneira seu sacerdócio vivido na ação pastoral e na participação das coisas alegres e também dolorosas da gente humilde. Falam as vozes dos amigos relatando as “estórias” curiosas da vida do P. Ambrósio. Dá gosto saboreá-las.
Como homem, disse-nos Sra. Divina Moreira, paroquiana de Hidrolina, Pe. Ambrósio era honesto, sincero e amigo de todos; brincalhão, e recordista em piadas, mesmo nas reuniões de conselho da assembleia, ele gostava de brincar. Pontual em tudo o que fazia, a começar pelos costumes da casa.
Certa vez, nos conta Sra. Divina, um Senhor da Paróquia de Pilar, depois da missa, pediu ao Pe. Ambrósio para levar um bilhete para Hidrolina, mas esse bilhete sumiu e, por mais que o procurasse, não o encontrou. No outro dia, ele voltou a pé até Pilar para contar àquele senhor que tinha perdido o bilhete, e pedir que lhe fizesse outro pra entregá-lo ao interessado e poder cumprir o favor que prometera ao amigo.
Como sacerdote, era severo até demais, dedicava-se de corpo e alma à vida de pobreza e simplicidade; nem roupa ele gostava de ter muitas, eram somente duas calças e duas camisas. Bom conselheiro, amigo, pai.
Estava sempre atento ao serviço da Igreja, mesmo nos seus momentos de fracasso. Nunca descuidou de suas obrigações. Como se percebia a olhos nus que ele estava bastante cansado, disse-lhe que, se quisesse, iria falar com o Sr. Bispo para mandar um padre no seu lugar e assim poderia descansar, ao que me respondeu: “Padre não se consagra para aposentar, quero morrer celebrando”.
Pe. Ambrósio tinha também uma fé forte, inquebrantável. Certa vez, relatam os moradores do lugar, perdera-se a chave da capela e o povo estava aflito para entrar. Pe. Ambrósio chegou, precisamente naquela hora, viu aquela confusão, não disse nada, aproximou-se da porta, clamou a Deus em alta voz e, no mesmo instante, a danada da porta se abriu, à vista de todos.
O fato seguinte se passou com Sra. Ubalda (esposa do Sr. Juvêncio, casal conhecidíssimo em Hidrolina), é a mesma Sra. Divina que no-lo refere.
A Sra. Ubalda havia pedido ao Pe. Ambrósio que, quando morresse, queria uma missa de corpo presente. O bondoso Padre disse que sim, mas sem dar muita importância ao que prometia. Não é que dias depois Sra. Ubalda veio a falecer?! Pe. Ambrósio foi à sua casa, fez a encomendação do corpo e, como sol já estava se pondo, tomou o seu burro e rumou para Itapaci, pois tinha compromisso de manhã. Horas depois de uma cavalgada em marcha serena, o animal desembestou num galope corisco, chacoteou o Padre no chão, e parou um pouco mais à frente. Refeito do susto, Pe. Ambrósio se levantou e foi andando de mansinho na sua direção, mas a uma braça de distância, o animal desandou a correr novamente, endoidecidamente. Quanto mais o Padre corria para pegá-lo, mais ele corria. Às vezes ele parava e, quando o Padre chegava perto, ele disparava de novo. A noite já ia adiantada. Sozinho na estrada, cansado, tendo como companheiro aquele burro xucro e endiabrado, foi quando lhe veio à mente a lembrança de Sra. Ubalda. Então lhe disse baixinho: se você me pegar o burro, vou celebrar a missa para você. Não deu outra. No mesmo instante, comentou Sra. Divina, o burro parou e veio para o lado do Padre que o pegou e o arriou como se nada tivesse acontecido. Montou e voltou para Hidrolina, e de manhã bem cedo celebrou a missa de corpo presente da finada Ubalda. “Si non è vero è bène trovato.”
Como intelectual, tinha uma inteligência incalculável, verdadeira biblioteca viva, ambulante.
Costumes: gostava de tomar coalhada no café da manhã, e dizia que era para não ficar velho... tomava café forte e sem açúcar. À tarde só tomava uma sopa e, na hora de deitar, um copo de limonada.
E Sra. Divina arrematou seu testemunho, afirmando que o Pe. Ambrósio tinha uma preocupação enorme pelas pastorais, sempre atento a tudo, embora confiasse os cargos aos leigos, não descuidava de nada. Sempre que celebrava nas capelas, levava consigo 3 ou 4 jovens para animar o povo, enquanto ele atendia as confissões e batizava. Esse foi o depoimento da Senhora Divina Maria Moreira, Hidrolina, GO.
Há outros depoimentos bonitos como este: “Pe. Ambrósio entendia perfeitamente a língua daquela gente simples e humilde. Além de seu trabalho na igreja feito com muita dedicação, ele visitava as famílias, aconselhava os casais, jovens e crianças, benzia as pessoas, ensinava remédios e procurava ajudar até financeiramente a quem precisasse. Tinha uma psicologia incrível, sabia compreender, acolher e animar as pessoas no sofrimento, na dor e na preocupação. Às vezes, conforme os amigos presentes, ele cantava uma música em italiano que nós gostávamos muito, e depois caía na risada. Era mesmo muito divertido! Ainda mais Pe. Ambrósio era uma pessoa extremamente culta. Gostava muito de ler e estava sempre atualizadíssimo em economia e política social. O povo o apelidava, carinhosamente, de biblioteca ambulante. Ao Pe. Ambrósio, nossa eterna admiração. Continue aí, do ladinho de Deus, intercedendo a Ele por nós. Assinado: Pedro, Rogério, Domingos e Dusseis.”
Também a família: Bartolomeu e Fátima Garcia e Filhos, assim se manifestou:
“Em 1976 chegou em Hidrolina o Pe. José Ambrósio Mota. Não media sacrifícios e cansaço pela sua idade em dedicar, ensinar e celebrar a Santa Missa todos os dias; aos sábados e domingos celebrava nas capelas rurais da Paróquia.
Pela década de 80, ele tomava seu precioso café matinal na casa do Sr. Miguel Luiz, o qual vendia passagem de ônibus; a comunidade dizia: sem a presença do Pe. Ambrósio, o ônibus não seguiria viagem, é que ele costumava despachar o ônibus e seus passageiros abençoando-os. Isto acontecia todos os dias, de domingo a domingo. Quando ele não aparecia, estava doente ou viajando.
Ele era também de coração bondoso, não sabia dizer “não”. Certa vez, emprestou seu fusca ao filho de um amigo seu, o qual se acidentou e, no acidente, morreu um dos rapazes que viajavam com ele. O carro foi parar no ferro velho. Isto lhe deu muitas dores de cabeça, mas apesar de tudo, Pe. Ambrósio nunca demonstrou tristeza e nem deixou de cumprir seus compromissos na sede e nas capelas. Sempre aparecia gente para leva-lo. Posteriormente, a comunidade lhe deu outro fusquinha, batizado com o nome de Herby 58, por causa do filme: ‘Se Meu Fusca Falasse’. É com muita dor no coração, com muita saudade e lágrimas no rosto, que relato esta passagem (e outras) de uma pessoa muito querida e especial na minha vida, na vida de meu marido e de meus filhos. Nós: Bartolomeu, Fátima Garcia, e afilhados: Noel e André”.
Também o Informativo da Diocese de Uruaçu – Goiás, Caminhar Juntos, ano XV, nº 165, jan/fev/ 99, p.2, assim se expressou:
“O número de sacerdotes da então Prelazia São José do Alto Tocantins, GO) era 7, excluído o Prelado. Trabalharam naquele difícil, árduo início, na comunidade de São José, Niquelândia, três padres: Valentim Rodrigues, Antônio Arteaga e José Ambrósio Mota.
Nunca o sacrifício faltou ao zeloso apóstolo, e nem faltará. “Sine effusione sanguinis non est remitio”. A mortificação haverá de ser sempre a companheira inseparável de quem se consagra à salvação das almas.
O nosso dedicado missionário – P. Ambrósio – viveu esta verdade e, poucos, como ele, terão feito tanto sacrifício nas suas excursões apostólicas percorrendo os 150 mil Km da então Prelazia, no lombo de burro... Viagens por entre atoleiros e por ásperas serras, passagens de rios de tanta nomeada, como o Maranhão, Tocantins, Paranã, Santa Tereza, Corrente e muitos outros, alguns deles focos de malária. Intermináveis caminhos a cavalo, hospedagem em choupanas de palha, nem sempre modelo de higiene. Dormida sobre rede, picadas de molestos insetos... São estas algumas das penitências com as quais o bravo missionário claretiano fez amizades nos sertões de Goiás.
A Diocese de Uruaçu se solidariza com a Congregação dos Filhos do Imaculado Coração de Maria, Claretianos, neste momento em que nos deixa o saudoso e abnegado Padre Ambrósio.
Alquebrado pela doença e sentindo o peso dos anos, Pe. Ambrósio passou o final de seus dias no aconchego da comunidade de Goianésia, que o cobriu de cuidados e carinhos.
Se a glória é a sombra da virtude, parodiando Cícero: “Gloria virtutem tanquam umbra sequitur”, podemos afirmar que o bondoso Pe. José Ambrósio Mota, CMF, aos 87 anos de idade, enriquecido de virtudes, partiu tranquilo, no dia 05 de fevereiro de 1999, para a casa do Pai.
Queremos encerrar todas essas declarações de apreço e amor ao inesquecível Pe. Ambrósio com o testemunho do Pe. José Maria Collell, CMF: “Quando recebi o povo de Hidrolina. Hoje reconheço que nós, claretianos de Goianésia, não merecemos tê-lo no cemitério de Goianésia. Espero que os Superiores façam justiça ao Povo de Hidrolina.” Descanse em paz “bem ao ladinho de Deus”, saudoso Pe. José Ambrósio Mota. RIP.